Xena: A Princesa Guerreira | 25 anos de sucesso

“Na época dos deuses antigos, opressores e reis, uma terra sem lei clamava por uma heroína”. Assim começa a abertura de um grande sucesso dos anos 1990. Xena: A Princesa Guerreira (Xena: Warrior Princess) estreou na TV americana em 4 de setembro de 1995 e marcou toda uma geração. Agora que a série chegou aos seus 25 anos, o Projeto Ítaca lança um artigo comemorativo. Vamos celebrar Xena e descobrir como a poderosa princesa, forjada no calor da batalha, mudou o mundo!

O legado de Xena

Sem dúvida, dizer que Xena: A Princesa Guerreira mudou o mundo não é um exagero ou força de expressão. Com 6 temporadas e 134 episódios, a série foi ao ar de setembro de 1995 a junho de 2001. Nesse meio tempo, reuniu grande número de fãs, gerou uma linha de produtos e marcou para sempre a história da TV, inspirando outros programas dali em diante.

A crítica aclamou a série, sobretudo por construir uma personagem feminina forte. Na verdade, Xena não só abriu as portas da representatividade como também foi ponta de lança numa época em que as mulheres ganhavam destaque na TV. Depois de Arquivo X, com a agente especial do FBI Dana Scully, da capitã Janeway de Jornada nas Estrelas: Voyager e da própria Xena, vieram séries como Buffy: A Caça-Vampiros, Alias: Codinome Perigo e tantas outras. Foi uma longa jornada até que as mulheres o papel principal em filmes de ação Star Wars: O Despertar da Força (2015) e Mulher-Maravilha (2017).

Xena é uma poderosa guerreira em busca de redenção, pois tenta se afastar de seu passado cruel e sanguinário. Com efeito, usa a força física e suas habilidades incríveis em defesa dos fracos e oprimidos. Foi a atriz neozelandesa Lucy Lawless, ainda em início de carreira, quem deu vida à Xena. Ela tinha apenas 26 anos quando a escalaram para o papel, e as filmagens ocorreram na sua terra natal. Hoje, ela é tão famosa quanto Xena. Em 2012, a atriz disse no Twitter que sua personagem vem da Bulgária, não dos mitos gregos (assim como a inspiração para a música-tema). Mas de onde surgiu a ideia para a série?

Como Xena surgiu

Xena surgiu como spin-off de Hércules (Hercules: The Legendary Journeys), outro sucesso dos anos 90. Ela fez parte do elenco do seriado, que trouxe Kevin Sorbo no papel do maior herói grego. Em princípio, o produtor Rob Tapert idealizou Xena como uma princesa guerreira do mal, e planejou a sua morte para o final de um arco de três episódios. Mas os planos mudaram. Diante da sua enorme aceitação pelos fãs, e da fama que superou a de Sorbo, os produtores resolveram criar uma programa só dela.

Hércules (Kevin Sorbo) e Xena (Lucy Lawless)

Na época, não havia heroínas na TV. Por isso, muitos pensavam que uma série estrelada por uma mulher não daria certo. O medo era que não fizesse sucesso e, portanto, não desse retorno financeiro. Mas Xena provou o contrário. Depois de um ano de exibição, a audiência cresceu e a série aos poucos foi ganhando público. Em 1998, Xena era atração em 108 países. No Brasil, foi exibida pelo SBT.

Gabrielle, a parceira de crimes

Xena é, sobretudo, uma história de redenção. Essa é a jornada da heroína. Mas como se muda alguém que, antes, era mau? De acordo com Tapert, o “compasso moral” de Xena é Gabrielle (Renee O’Connor), sua amiga e companheira. Ao longo da série, a jovem mulher evoluiu de uma simples camponesa para uma amazona e forte aliada. A inocência de Gabrielle serve de contrapeso ao vigor da heroína.

Aliás, a relação de Xena e Gabrielle era o ponto central da história. Não por acaso, conforme a série se popularizava, a comunidade LGBTQIA+ rapidamente identificou um elo forte e único entre as personagens. Para seus membros, que nos anos 90 eram não só vítimas de opressão e preconceito, como eram também socialmente invisibilizados, ver-se ou sentir-se vistos na TV era algo novo. Nesse sentido, Xena quebrou um tabu e abriu caminho para a representação dos relacionamentos homoafetivos em produções subsequentes. A relação das heroínas ficou muito no subtexto da trama, ou seja, nunca foi confirmada de forma explícita. Contudo, não passou despercebida.

Gabrielle (Renee O’Connor) e Xena

O nome Xena significa “estrangeira” ou “estranha”. De acordo com Lawless, ainda que a princesa guerreira sentisse que não era capaz de se redimir, “a amizade entre Xena e Gabrielle transmitia uma mensagem de autoestima, merecimento e honra para pessoas que sentiam-se muito marginalizadas, então teve muita ressonância na comunidade gay. Um monte de gente vem até mim, agradecendo pelo que eu fiz. Eu sou completamente indigna disso; éramos apenas atrizes contratadas, nos divertindo muito aqui no fim do mundo”. Mas Xena se tornaria um símbolo de coragem, aceitação e resistência, e Lawless certamente foi uma das grandes responsáveis por espalhar essa mensagem.

Os lugares reais e míticos

Xena: A Princesa Guerreira é uma série de fantasia histórico-mitológica, cujo palco principal é a Grécia Antiga. No entanto, certa elasticidade espaço-temporal leva a trama a outros lugares, como o Egito, a Índia e a Europa medieval. A representação da Grécia Antiga tomou como base lugares e costumes históricos, mas eles sofreram adaptações com o propósito de criar um mundo ficcional mais atraente. As aldeias rurais e as cidadezinhas ficam em paisagens montanhosas, de um verde exuberante. Os principais lugares têm o nome de antigas cidades gregas e trazem algumas de suas características.

Já os mundos míticos surgem como se também fossem reais, e podem ser acessados através de lagos, cavernas e outras áreas secretas. Entre eles se destacam os Campos de Elísio, o Tártaro, o Mundo dos Mortos, o Valhalla, o Céu e o Inferno. Além disso, Xena e Gabrielle também vão a locais mais “modernos” como a Alexandria de Cleópatra e a Roma de Júlio César. Isso é possível devido à elasticidade espaço-temporal, conforme vimos antes. De certo modo, é como se Xena existisse em várias épocas.

Chamada de Xena no SBT.

A mitologia multicultural de Xena

Vários panteões existem ao mesmo tempo em Xena: A Princesa Guerreira. Isto é, tanto os deuses gregos quanto os nórdicos e os de outras religiões aparecem, cada qual reinando sobre uma parte do mundo. Antes, essa ideia era comum nos quadrinhos da Marvel; posteriormente, seria recorrente na cultura pop. Mas, se a base da série é a mitologia grega, com seus deuses, monstros e heróis, ela vai ao longo dos episódios se mesclando com temas judaico-cristãos.

Outros temas vêm da mitologia e das religiões asiáticas, mas com grande liberdade poética e pouco cuidado com a sua representação. Essa liberdade chegou a causar problemas. Por exemplo, quando vão à Índia, Xena e Gabrielle encontram-se com Krishna, deus maior do hinduísmo. Esse arco de 1999 chateou alguns adeptos da religião, posto que não gostaram de ver tal imagem na série. Problemas à parte, Xena certamente deve muito de seu sucesso à matriz rica e multicultural de seu universo fantástico.

Ao adotar temas de vários mitos, a série adaptou-os de forma anacrônica (com erros cronológicos, ainda que propositais) para que coubessem dentro do mundo narrativo. Essa mistura foi, sem dúvida, uma das razões de seu status “cult” no fim dos anos 90 e no início dos anos 2000. Ou seja, a série tornou-se um objeto de “culto” e admiração ao redor do mundo. Além disso, Xena foi um dos primeiros programas de TV com uma sólida base de fãs na Internet, e eles se reúnem anualmente em convenções.

Os personagens lendários

Centauro em Last of the Centaurs (ep. 17, temporada 6).

Nenhum centauro se feriu durante as gravações, já que vários seres lendários marcam presença em Xena. Para citar alguns: Morfeu (deus do sono), Pandora, Ulisses, Baco (deus do vinho), Golias, Prometeu, Beowulf, as Valquírias, os Titãs e as Fúrias. Em geral, os deuses e seres que vivem nos mundos míticos tomam forma humana e movem-se livremente entre seus reinos e o mundo real. Seu visual também é bastante estilizado. Por exemplo, o deus da guerra Ares é um homem egoísta com roupas de couro preto cravejado. Afrodite, a deusa do amor, é uma socialite loira com vestido cor-de-rosa.

25 anos depois…

Xena se tornou uma lenda pelos próprios méritos. A princípio uma versão feminina de Hércules, ela superou o filho de Zeus em todos os sentidos, e sempre será lembrada. Em sua jornada, Xena vence vilões, deuses e monstros como a princesa guerreira que é. Aliás, a guerra é frequente em seu mundo, tanto quanto no nosso. Talvez seja hora dela voltar, pois o mundo ainda clama pela heroína e os oprimidos precisam da sua força. Como disse Lawless, “ainda há pessoas que se sentem marginalizadas, ainda há pessoas que querem honra e igualdade. E é disso que trata esse programa”.

25 anos depois, a coragem da princesa guerreira continua mudando o mundo. Enquanto sonhamos com um filme ou uma sequência de Xena, vale a pena rever cada episódio desse clássico cult. Não deixe de ouvir o podcast de aniversário da SYFY WIRE / FANGRRLS, no Spotify (em inglês), bate-papo com fãs que seguiram a jornada da heroína:

Referências

Xena: Warrior Princess: An Oral Herstory“, em Entertainment Weekly.

Grab Your Chakrams: These 25 Facts About Xena Will Leave You Chanting a Battle Cry“, em E! Entertainment.

Para saber mais:

Como citar este artigo? (ABNT)

REIS FILHO, L. Xena: A Princesa Guerreira | 25 anos de sucesso, Projeto Ítaca. Disponível em: https://projetoitaca.com.br/os-25-anos-de-xena-a-princesa-guerreira/. Acesso em: 28/10/2024.

Lucio Reis Filho

Lucio Reis Filho

Lúcio Reis Filho é Ph.D. em Comunicação (Cinema e Audiovisual), escritor e cineasta especializado nas interseções entre Cinema, História e Literatura, com foco nos gêneros do horror e da ficção científica. Historiador com especialização em Estudos Clássicos pela Universidade de Brasília, em parceria com a Cátedra Unesco Archai (Unb/Unesco), é Coordenador do Projeto Ítaca. Seus interesses acadêmicos e de pesquisa são essencialmente interdisciplinares; abrangem Cinema, Artes Visuais, História, Literatura Comparada e Estudos da Mídia. Escreve periodicamente resenhas de livros, filmes e jogos para diversas publicações.
Lucio Reis Filho

Lucio Reis Filho

Lúcio Reis Filho é Ph.D. em Comunicação (Cinema e Audiovisual), escritor e cineasta especializado nas interseções entre Cinema, História e Literatura, com foco nos gêneros do horror e da ficção científica. Historiador com especialização em Estudos Clássicos pela Universidade de Brasília, em parceria com a Cátedra Unesco Archai (Unb/Unesco), é Coordenador do Projeto Ítaca. Seus interesses acadêmicos e de pesquisa são essencialmente interdisciplinares; abrangem Cinema, Artes Visuais, História, Literatura Comparada e Estudos da Mídia. Escreve periodicamente resenhas de livros, filmes e jogos para diversas publicações.

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