Rumpelstiltskin: as origens do duende esperto

Já ouviu falar em Rumpelstiltskin? Você consegue ler esse nome em voz alta sem gaguejar? Vamos conhecer o duende esperto que nasceu na tradição oral e nos contos de fadas europeus, e que hoje ressurge de várias formas na cultura pop. Em essência, sua história envolve temas universais como a magia, a ganância e, principalmente, a importância de manter promessas.

A história de Rumpelstiltskin

O pacto com o duende

A fim de impressionar o rei, um moleiro pobre mentiu: disse que sua filha era capaz de fiar palha e transformá-la em ouro. O ganancioso rei, então, chamou a moça; fechou-a numa torre com palha e uma roda de fiar, e exigiu que fizesse tudo em ouro até o amanhecer, durante três noites. Algumas versões diziam que, se acaso a moça falhasse, seria empalada e depois cortada em pedaços feito um porco; outras, menos violentas, diziam que ela seria prisioneira na torre para sempre.

Como o dom não passava de uma invenção de seu pai, a moça não sabia o que fazer. Já não havia esperanças, até que surgiu um homenzinho semelhante a um duende. Em troca do seu colar, ele fez o serviço e transformou toda a palha em ouro. Na noite seguinte, pediu seu anel. Na terceira, quando já não restava mais nada à moça, ela teve uma ideia: prometeu ao duende o primeiro filho que um dia tivesse. O rei, de tão impressionado, decidiu se casar com a filha do moleiro.

O duende volta para cobrar sua dívida

Posteriormente, quando o filho do casal enfim nasceu, o duende voltou para cobrar sua dívida. “Agora, dá-me o que me prometeste”, disse ele. Assustada, mas determinada a ficar com a criança, a rainha ofereceu-lhe toda a sua riqueza. A princípio, o duende recusou; por fim, acabou aceitando, mas impôs uma nova condição: ela teria que adivinhar seu nome no prazo de três dias. No primeiro dia, a rainha falhou. No dia seguinte, seu mensageiro ouviu o duende cantar à volta de uma fogueira:

Hoje faço o pão, amanhã a cerveja; a melhor é minha.

Depois de amanhã ganho o filho da rainha.

Que bom que ninguém sabe direitinho

que meu nome é Rumpelstiltskin!”

Logo que o duende retornou no terceiro dia, a rainha então revelou seu nome. E ele, zangado por perder a aposta, fugiu para nunca mais voltar. Assim termina a história de Rumpelstiltskin, conforme aparece na edição de 1812 dos Contos dos Irmãos Grimm. Anos mais tarde, na revisão de 1857, ela ganharia um final macabro: cego de raiva, o duende bateu os pés com tanta força que se partiu em dois.

As origens no folclore e na mitologia

Sem dúvida, o famoso duende ficou conhecido graças aos Irmãos Grimm; mas sua história já existia antes, nas tradições orais e folclóricas europeias – principalmente alemãs, com diferentes versões na França, na Itália e na Inglaterra. Nelas, o enredo básico se mantêm, mas alguns detalhes variam, como o destino do personagem após perder a aposta, por exemplo. De acordo com Graham Anderson, a história pode ser ainda mais antiga, posto que remonta à antiguidade e à mitologia greco-romana. O autor cita algumas lendas exemplos semelhantes em seu livro Fairytale in the Ancient World (2000).

Rumpelstiltskin na literatura…

Os irmãos Jacob e Wilhelm Grimm tiveram um papel importantíssimo na preservação e na popularização de contos de fadas. Nas suas coletâneas de textos folclóricos, deram a essas fontes tradicionais formas mais elaboradas e acessíveis. Na versão dos Grimm, a história de Rumpelstiltskin tem elementos mágicos e sobrenaturais, o que fez dela uma leitura mais atraente para o público infantil. Além disso, dá ênfase à astúcia e à resolução de problemas, aspectos que eram valorizados na sociedade da época.

Ainda que tenha ido embora para nunca mais voltar – de acordo com uma versão –, o famoso duende ressurge na literatura contemporânea. Autores de diferentes gêneros exploram e reinventam sua história, trazendo-a para novos contextos. No livro The Rumpelstiltskin Problem (2000), por exemplo, Vivian Vande Velde criou seis versões alternativas desse conto de fadas, com reviravoltas surpreendentes.

… e seu retorno na Cultura Pop

Na cultura pop também há inúmeras versões e releituras de Rumpelstiltskin, que continua a encantar o público até os dias de hoje. Ele é o principal vilão do filme Shrek Para Sempre (2010), da DreamWorks, no qual aparece como um trapaceiro astuto e manipulador comparável ao Loki da mitologia nórdica. Antes, no filme de horror de 1995 que leva o seu nome, o duende desperta em Los Angeles com o propósito de raptar uma criança. Por sua vez, outra interpretação recente é o Sr. Gold da série de TV Once Upon a Time, cuja personalidade complexa dá novas camadas ao personagem.

Rumpelstiltskin é um ótimo exemplo de como os contos de fadas e o folclore transcendem fronteiras culturais, sem perder relevância na atualidade. De suas origens nas tradições orais europeias, que os Irmãos Grimm reuniram posteriormente, a história do famoso duende continua sendo uma fonte de inspiração importante. Decerto, o apelo duradouro de Rumpelstiltskin vem da sua capacidade de abordar temas universais – como as promessas quebradas, por exemplo –, que afetam um público amplo em termos de faixa-etária e nacionalidade. Enquanto sua história continuar inspirando novas versões e releituras, a saga desse personagem folclórico permanecerá viva no imaginário.

Referências

Fairytale in the Ancient World (2000), de Graham Anderson.

Como citar este artigo? (ABNT)

REIS FILHO, L. Rumpelstiltskin: as origens do duende esperto, Projeto Ítaca. Disponível em: https://projetoitaca.com.br/rumpelstiltskin-as-origens-do-duende-esperto/. Acesso em: 01/05/2024.

Lucio Reis Filho

Lucio Reis Filho

Lúcio Reis Filho é Ph.D. em Comunicação (Cinema e Audiovisual), escritor e cineasta especializado nas interseções entre Cinema, História e Literatura, com foco nos gêneros do horror e da ficção científica. Historiador com especialização em Estudos Clássicos pela Universidade de Brasília, em parceria com a Cátedra Unesco Archai (Unb/Unesco), é Coordenador do Projeto Ítaca. Seus interesses acadêmicos e de pesquisa são essencialmente interdisciplinares; abrangem Cinema, Artes Visuais, História, Literatura Comparada e Estudos da Mídia. Escreve periodicamente resenhas de livros, filmes e jogos para diversas publicações.
Lucio Reis Filho

Lucio Reis Filho

Lúcio Reis Filho é Ph.D. em Comunicação (Cinema e Audiovisual), escritor e cineasta especializado nas interseções entre Cinema, História e Literatura, com foco nos gêneros do horror e da ficção científica. Historiador com especialização em Estudos Clássicos pela Universidade de Brasília, em parceria com a Cátedra Unesco Archai (Unb/Unesco), é Coordenador do Projeto Ítaca. Seus interesses acadêmicos e de pesquisa são essencialmente interdisciplinares; abrangem Cinema, Artes Visuais, História, Literatura Comparada e Estudos da Mídia. Escreve periodicamente resenhas de livros, filmes e jogos para diversas publicações.

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