O deus Sobek em AC Origins: viagem à Crocodilópolis

Deus Sobek

Há um grande oásis no centro de Fayum, às margens do rio Nilo. Lá, fica a cidade de Crocodilópolis, que podemos visitar em Assassin’s Creed Origins (2017). Na trama desse game da Ubisoft, ambientado no Egito antigo, o herói Bayek de Siwa viaja para a região a fim de achar um assassino. De fato, como o próprio nome da capital de Fayum sugere, há crocodilos nas águas que cruzam a terra árida. Os répteis surgem de repente para atacar o jogador. Mas o curioso nome da cidade, que realmente existiu, vem da mitologia egípcia e do culto ao deus Sobek. Afinal, o crocodilo era sagrado para os povos locais.

Fayum e a Cidade do Crocodilo

Por volta de 4.000 a.C., uma cidade surgiu nas terras férteis do Nilo, à sudeste de Mênfis. Hoje Medinet el Fayum, ela se ergueu numa das regiões povoadas mais antigas do mundo. Foi, portanto, uma das primeiras cidades do Egito antigo. Na era dos faraós, os egípcios a chamavam de Shedet.

Al-Fayyūm, também Fayum ou Faium, ficava no deserto ocidental ao sul do Cairo, dentro de uma grande depressão. A localização geográfica, protegida pelo relevo, atraiu caçadores pré-históricos em virtude de seu clima ameno e da caça abundante, favoráveis à vida.

Mapa de Crocodilópolis, por Jean-Claude Golvin.

Posteriormente, foi uma cidade importante do Médio Império (2000-1580 a.C.). Na Dinastia XII (1938-1756 a.C.), era a principal do nomo Arsinoites, na margem ocidental do Nilo. Os gregos a chamaram de Crocodilópolis, isto é, “Cidade do Crocodilo”, já que a sua população cultuava o animal.

O deus-crocodilo Sobek

O povo de Crocodilópolis adorava o deus Sobek, que, não surpreendentemente, tem face de crocodilo. Na verdade, ora ele tem a forma desse animal, com uma coroa de plumas, ora é parcialmente humano. Na cultura egípcia, a habilidade do crocodilo para arrebatar e destruir fez dele manifestação de destreza real. No santuário de Sobek em Sumenu, por exemplo, uma bela estátua em díade da Dinastia XVIII ilustra a relação do faraó com esse deus. Ele, que era símbolo do poder do rei, surgiu nos textos sagrados do Antigo Império (3200-2300 a.C.) como filho de Neith (a deusa-mãe). De acordo com certas crenças, Sobek surgiu das “Águas Escuras” e criou tanto o mundo quanto a ordem no universo.

O deus Sobek. Relevo, Templo de Sobek e Haroeris em Kom Ombo, Egito.

Na mitologia egípcia, Sobek era um deus do Nilo e aquele que trouxe fertilidade à terra. Nos pântanos e nas margens dos rios, a caça aos crocodilos era uma honra a essa deidade, cujos templos se espalhavam pelo Egito. Além disso, Sobek tinha relação com locais específicos de Fayum, região particularmente sagrada para o seu culto, como Shedet. Os gregos continuaram a venerá-lo, não só como Sobek, mas também como “Suchos”. Por isso deram à cidade o nome de “Crocodilópolis” em sua honra.

Petsuchos, o crocodilo sagrado

Na era dos faraós, o centro do culto a Sobek ficava em Crocodilópolis, cujos habitantes eram devotos do representante desse deus na terra. Lá, mantinham um crocodilo sagrado, vivo, em um templo com areia, comida e um lago. Coberto de ouro e pedras preciosas, seu nome era Petsuchos. Depois que o animal morreu, os devotos o substituíram por outro crocodilo sagrado.

A região onde ficava Crocodilópolis era a mais fértil do Egito antigo. Isso porque, além dos cereais e vegetais mais comuns no vale do Nilo, a área abundava em tâmaras, figos e rosas. Seus vinhedos e jardins rivalizavam com os de Alexandria e das áreas próximas. Lá também se cultivava a oliveira. Posteriormente, tanto os Ptolomeus quanto o Império Romano dominaram a cidade.

Em contraste, as pessoas viam os crocodilos como verdadeiros monstros em certas regiões. Seus olhos indicavam o nascer do dia; sua goela, um assassinato; sua cauda, as trevas e a morte. Nesse sentido, os hieróglifos revelam a diversidade de crenças, ao mesmo tempo que explicam seu significado.

A provação de Sobek

De volta a AC Origins, Bayek vai a Crocodilópolis a fim de achar um assassino. O protagonista é um “medjay”, substantivo para os nativos ou habitantes de certo país, estado ou cidade. (No Egito antigo, os medjay formavam um corpo militar com a função de manter a ordem e a segurança no reino). Lá, Bayek toma contato com o culto a Sobek e o crocodilo sagrado.

Em novembro de 2017, o game ganhou o seu primeiro evento limitado como parte das “Provações dos Deuses”, isto é, uma boss battle que dá prêmios. Nele, era possível lutar contra Anúbis, o deus dos mortos. Duas semanas depois, entre os dias 21 e 28, foi a vez de Sobek emergir poderoso das areias do deserto. Daí em diante, a Ubisoft passou a introduzir cada vez mais seres da mitologia no universo de Assassin’s Creed, o que também fez em Odyssey e Valhalla. Veja o vídeo abaixo:

A batalha contra o deus Sobek.

Leia mais sobre a mitologia egípcia nos games!

Referências

Dicionário de símbolos (2020), de Jean Chevalier e Alain Gheerbrandt.

The Routledge Dictionary of Egyptian Gods and Goddesses (2005), de George Hart.

“What is the oldest city in the world?” (The Guardian, 16/02/2015), por Nick Compton.

“Al-Fayyūm” em Encyclopaedia Britannica.

“Crocodilopolis” em hellenicaworld.com.

“Faiyum Oasis” em AC Creed Wiki.

Como citar este artigo? (ABNT)

REIS FILHO, L. O deus Sobek em AC Origins: viagem à Crocodilópolis, Projeto Ítaca. Disponível em: https://projetoitaca.com.br/o-deus-sobek-de-crocodilopolis-ac-origins/. Acesso em: 01/04/2024.

Lucio Reis Filho

Lucio Reis Filho

Lúcio Reis Filho é Ph.D. em Comunicação (Cinema e Audiovisual), escritor e cineasta especializado nas interseções entre Cinema, História e Literatura, com foco nos gêneros do horror e da ficção científica. Historiador com especialização em Estudos Clássicos pela Universidade de Brasília, em parceria com a Cátedra Unesco Archai (Unb/Unesco), é Coordenador do Projeto Ítaca. Seus interesses acadêmicos e de pesquisa são essencialmente interdisciplinares; abrangem Cinema, Artes Visuais, História, Literatura Comparada e Estudos da Mídia. Escreve periodicamente resenhas de livros, filmes e jogos para diversas publicações.
Lucio Reis Filho

Lucio Reis Filho

Lúcio Reis Filho é Ph.D. em Comunicação (Cinema e Audiovisual), escritor e cineasta especializado nas interseções entre Cinema, História e Literatura, com foco nos gêneros do horror e da ficção científica. Historiador com especialização em Estudos Clássicos pela Universidade de Brasília, em parceria com a Cátedra Unesco Archai (Unb/Unesco), é Coordenador do Projeto Ítaca. Seus interesses acadêmicos e de pesquisa são essencialmente interdisciplinares; abrangem Cinema, Artes Visuais, História, Literatura Comparada e Estudos da Mídia. Escreve periodicamente resenhas de livros, filmes e jogos para diversas publicações.

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